
Por: Dra. Rossa R. Rossini Camacho
Delegada de Polícia aposentada, Advogada e Conselheira do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo (CECF)
A violência representa hoje uma das principais causas de morbimortalidade, e, enquanto essa violência nos espaços públicos atinge predominantemente os homens, é nos espaços privados que aflige as mulheres, crianças, adolescentes e idosos.
A violência doméstica atinge as mulheres no mundo inteiro. Pode ser prevenida e também existem mecanismos para o seu enfrentamento, proteção e superação, que contribuem para minimizar os efeitos nocivos causados nas vítimas, familiares e em toda a sociedade.
Conforme dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento, os custos da violência doméstica para o Brasil são equivalentes a 10,5% do seu PIB, emperrando o seu progresso, mas podem ser minimizados com ações preventivas.
Também, segundo a ONU, um dos fatores necessários para o desenvolvimento e a sustentabilidade das nações, neste milênio, é a emancipação e autonomia das mulheres, devidamente empoderadas, gerando renda, vivendo com dignidade e sem violência.
A violência doméstica é algo que pode ocorrer em todas as famílias e em qualquer classe social, podendo ser detectada ou não pelos membros da casa. Embora ela seja uma realidade, não é uma fatalidade, porque pode ser evitada e prevenida por ações governamentais, da sociedade, da comunidade e da família.
Vale ressaltar que são desencadeadas pelo Estado (governo municipal, estadual e federal) as políticas públicas para as mulheres, crianças, adolescentes e idosos, que, nada mais são, um conjunto de programas, ações e atividades que visam assegurar os direitos de cidadania dessas vítimas, garantidos constitucionalmente.
Por dia, 10.800 mulheres são vítimas de agressão no Brasil. O dado é baseado na estimativa feita pela ferramenta Relógio da Violência, desenvolvida pelo Instituto Maria da Penha (IMP), mostrando que, a cada oito segundos, uma brasileira é vítima de agressão física.
Quanto ao aspecto legal, há a Lei 11.340/2006, também chamada de Lei Maria da Penha, que tem como objetivo criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Também existe a Lei 8.069/1990, chamada de ECA – Estatuto da Criança e Adolescente, que dispõe sobre a proteção integral à criança e adolescente, e ainda a Lei 10.741/2003, denominada de Estatuto do Idoso, que protege e garante direitos aos idosos.
Os aspectos culturais e sociais que levam o agressor a praticar a violência contra mulheres, crianças, adolescentes e idosos são vários, destacando-se principalmente: ignorância (educação), preconceito, discriminação, posse, dominação, força física, provedor, poder, vínculo afetivo, dependência financeira e o machismo.
Muitas vítimas sofrem caladas e vivem em situação de violência por anos a fio e não denunciam a violência sofrida, pois têm ligação afetiva com o agressor e medo de prejudicá-lo, bem como a seus filhos (por exemplo, não querem ver o pai de seus filhos preso), temem sofrer uma violência ainda maior, sentem vergonha dos vizinhos, amigos e da família, culpadas e/ou responsáveis pela violência que sofrem, não possuem condições financeiras para mudar sua vida, se sentem fracassadas na escolha do parceiro, com perda da identidade – autoestima e autoimagem e, por vezes, desconhecem os seus direitos de viver uma vida sem violência.
Quando a vítima for mulher (maior de 18 anos), ela própria pode denunciar, sendo que, ao chegar aos hospitais e unidades de saúde, estes devem encaminhá-la para formalizar denúncia formal. Quando a vítima for criança, adolescente ou idoso, qualquer pessoa pode fazer a denúncia da violência sofrida hospitais, unidades de saúde, familiares, vizinhos, conselho tutelar, escolas, denúncia anônima.
As denúncias formais devem ser feitas na Delegacia de Polícia, preferencialmente na Delegacia da Mulher, ou do Idoso, ou da Criança, onde houver essas Delegacias Especializadas, podendo também serem feitas por telefone, nos chamados Disque-Denúncia, principalmente através dos números 100 ou 180, que atendem chamadas gratuitas de todo Brasil e até do exterior, 24 horas por dia, sem necessidade de ficha telefônica. Essas denúncias via fone geram um protocolo, que é encaminhado para a Delegacia de Polícia da área, a quem caberá investigar o caso.
Denunciar a violência doméstica é importante para que mecanismos governamentais sejam desencadeados para o enfrentamento desse tipo de problema e também para minimizar os seus efeitos, pois quem se cala diante da violência doméstica está sendo conivente com ela. É importante ressaltar que devemos, ao saber de um caso de violência, ser acolhedores e solidários com a vítima, auxiliando-a a fazer valer seus direitos, pois, muitas vezes, devido à humilhação, à exposição e à violência sofrida, ela fica amedrontada e confusa. Precisamos ser um ponto de luz para essa vítima, mostrando-lhe alguns caminhos que possibilitem quebrar o ciclo da violência.
Denunciada formalmente a violência doméstica na Delegacia de Polícia, através do Registro de um Boletim de Ocorrência, de um Termo Circunstanciado ou até mesmo de um Flagrante, são seguidos todos os procedimentos de polícia judiciária, que culminarão com um relatório da Autoridade Policial, que é encaminhado ao Fórum para a apreciação do Judiciário, inclusive com pedido de medidas protetivas para a vítima, se necessário. Com esse registro formal da denúncia da violência doméstica, será dado à vítima atendimento especializado por profissionais capacitados e sensibilizados, que a acolherão e a orientarão para garantia de seus direitos e de sua integridade física, moral, social, psicológica e patrimonial.
O desconhecimento das leis e da existência de serviços jurídicos, assistenciais e médicos, especializados e gratuitos, com os quais podem defender-se e ser acolhidas, limita em muito a vida das vítimas de violência doméstica, especialmente nas regiões mais carentes, onde tais serviços inexistem ou são ineficientes.
A prevenção e o enfrentamento da violência doméstica são responsabilidades de todos nós, exigindo a efetiva integração de diferentes setores, tais como saúde, segurança pública, assistência social, justiça e trabalho e toda a sociedade civil, inclusive as igrejas e associações de moradores de bairros, pois só assim caminharemos para a construção de uma sociedade de paz.
A agressão pode ser física ou psicológica. Mas sua atitude pode mudar esta história.
NÃO SE CALE!
DENUNCIE!
DISQUE-DENÚNCIA 100 ou 180
